‘BBB’ do TRC

Câmeras instaladas em caminhões são aliadas da segurança do trabalhador e da eficiência operacional

Capa / 18 de Julho de 2022 / 0 Comentários
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Ausência de roubos de cargas, controle total de insumos, redução do número de acidentes e preservação da saúde dos motoristas. Esses foram os principais benefícios alcançados com a instalação de câmeras na frota da Transpedrosa. Em 2014, a empresa implantou novas medidas com o objetivo de utilizar a tecnologia como aliada da prestação de serviço e dos profissionais.

“Foi uma jornada. Primeiramente, colocamos câmeras na parte externa de alguns veículos e, com os resultados alcançados, fomos evoluindo. Hoje, toda a frota – ou seja, nossos 500 caminhões – conta com diversos equipamentos. Há câmeras internas (cabines) para a identificação de fadiga, bem como frontais, traseiras e laterais, para auxiliarem em pontos cegos”, explica a coordenadora de Saúde, Segurança e Meio Ambiente da Transpedrosa, Larissa Mendes Silva Guimarães.

Ela conta que, no começo, os profissionais achavam que o objetivo era procurar erros no trabalho deles. “Ouvíamos que era o ‘BBB’ [em referência ao reality show], mas, com o uso das câmeras, a percepção mudou radicalmente. Os motoristas entenderam que elas são parceiras, tanto para mostrar que estão certos em casos de incidentes quanto para ensinar lições, com caráter pedagógico”, afirma Larissa.

Um dos indicadores mais interessantes da confiança adquirida, segundo a coordenadora, é que, quando os agregados saem da transportadora, solicitam a compra dos aparelhos que os ajudaram em diversas situações.

Marcos Antônio Quiel foi um dos primeiros motoristas a usufruir da tecnologia na Transpetro. Ele lembra que, inicialmente, havia mesmo uma resistência entre os profissionais da empresa. Porém, aparelhos logo se tornaram aliados. “O equipamento mostra que estamos certos, o que podemos melhorar e que veio para somar”, avalia.

Atualmente, Quiel é Master Drive e destaca que as câmeras são parceiras dos transportadores, pois revelam que, na maioria dos casos de acidentes, o motorista profissional não é o culpado, e evitam, de forma muito eficiente, o roubo de cargas. “Os assaltantes sabem que o rosto deles será filmado e, por isso, desistem, partindo para veículos que não contam com essa tecnologia”, diz.

 

Tecnologia do bem

Além de as câmeras monitorarem o veículo e o condutor, atualmente, elas têm a capacidade de identificar desvios de comportamento: conseguem captar se o profissional está cansado, sentindo dor ou até mesmo sofrendo um mal súbito. 

Isso acontece porque o monitoramento embarcado inclui gravadores e softwares de gestão, inteligência artificial, análise de eventos e gestão de ocorrências. Esse conjunto de recursos permite monitorar em que situação se encontram a frota e os motoristas: falta de sinalização, buraqueiras, asfaltos e acessos precários que podem causar acidentes, danificar os veículos e resultar em atrasos.

Também chamada de câmera embarcada, a tecnologia possibilita gerenciar com precisão e em tempo real uma série de informações: se o veículo está cumprindo a rota determinada, como o motorista se porta quando está dirigindo e qual o estado da carga transportada.

Há equipamentos para essas diversas situações e com funcionalidades para garantir a qualidade da imagem, como alta resolução, grande ângulo de visão e visualização noturna, e a câmera veicular pode estar programada para focar somente a captação ou a identificação inteligente de eventos como fadiga, uso do celular e ausência do cinto de segurança.

 

Privacidade garantida

Um ponto extremamente importante é a garantia da privacidade do motorista. Larissa e Quiel afirmam que as câmeras instaladas na cabine funcionam apenas quando o veículo está ligado e não focam a cama, por exemplo. “Sem dúvidas, essa é uma premissa essencial para a gestão de pessoas nas empresas. É preciso resguardar a privacidade e a integridade do profissional o tempo todo. A Lei 13.709/2018 – conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) – considera a imagem como um dado pessoal sensível, uma vez que ele é biométrico, o que exige um cuidado mais rigoroso em seu tratamento”, ressalta o advogado Márcio Américo Mata, especialista em direito civil com atuação no escritório Paulo Teodoro, parceiro da Federação e do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas e Logística de Minas Gerais (Fetcemg e Setcemg) e da Confederação Nacional do Transporte (CNT).

Nesse contexto, o tratamento de dado pessoal sensível é possível desde que o titular o autorize exclusivamente para uma determinada finalidade. Entretanto, conforme a LGPD, há dispensa do consentimento para tais imagens/filmagens em casos de proteção da vida, integridade física do titular ou de terceiros.

“Já tivemos casos em que o caminhão estava parado em um determinado local, e, por meio de suas câmeras, foram gravadas imagens de um acidente com terceiros que não envolveu o veículo pesado. Caso a Polícia Rodoviária Federal ou uma ordem judicial solicite a gravação, a transportadora poderá cedê-la, desde que se borrem algumas partes das imagens que exponham informações que não fazem parte do fato em si (rostos e placas veiculares)”, explica o advogado.

Em 2020, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que o monitoramento dos empregados no ambiente de trabalho por meio de câmera é lícito e, como tal, não gera dano moral coletivo. Para o TST, “o monitoramento é perfeitamente possível, desde que não haja abusos, como câmeras espiãs ou câmeras em banheiros e vestiários, e se insere no poder fiscalizatório do empregador, desde que a supervisão aconteça em locais onde os empregados executam suas atividades laborais”, definiu a sentença.

Mata pontua que, para oferecer segurança jurídica, o contrato de trabalho deve estabelecer o modelo de vigilância por meio de câmeras. Se ele for implementado após a contratação do funcionário, basta fazer um aditivo.

 

Informações nas nuvens

Para funcionar em um caminhão, a câmera embarcada precisa de um DVR (gravador de vídeo), que centraliza as imagens e as armazena, possibilitando a transmissão por meio da rede 4G.

O DVR também permite que uma central à distância grave e acompanhe ao vivo todo o trajeto feito pela frota, bem como as ações de quem está dirigindo, permitindo a tomada de providências imediatas após um acidente ou um roubo. Normalmente, as informações são armazenadas na “nuvem”, ou seja, em um diretório virtual com uma forte chave de segurança. Assim, é possível coletar material para averiguar situações pra treinamentos e defesas legais, além de enviar imagens à seguradora ou a órgãos públicos.

Com o sistema completo (câmeras, DVRs, inteligência artificial e software), pode-se fazer o controle de jornada do motorista por meio de localização em tempo real, dados de velocidade do veículo e sensores capazes de identificar possíveis problemas a serem analisados. Essas funcionalidades garantem maior segurança, controle da frota para a empresa e eficiência operacional.

 

Governança

Uma ação tão importante quanto o armazenamento é a gestão das informações. É preciso adotar políticas de governança pelos agentes de tratamento nas empresas. “A LGPD recomenda que os controladores e operadores formulem regras de boas práticas e de governança que estabeleçam as condições de organização, o regime de funcionamento, os procedimentos, incluindo reclamações e petições de titulares, as normas de segurança, os padrões técnicos, as obrigações especificas para os diversos envolvidos no tratamento, as ações educativas, os mecanismos internos de supervisão e de mitigação de riscos e outros aspectos relacionados ao tratamento de dados pessoais”, recomenda o Guia de Boas Práticas de Proteção de Dados no Setor de Transporte elaborado pela CNT.

Para tanto, tais agentes devem sempre considerar, em relação ao tratamento e aos dados, a natureza, o escopo e a finalidade, bem como a probabilidade e a gravidade dos riscos e dos benefícios decorrentes deles. Além disso, devem demonstrar o seu comprometimento em adotar processos e políticas internas que assegurem o cumprimento de forma abrangente e transparente. “A comunicação e o trabalho conjunto com os motoristas e a equipe de logística são ferramentas fundamentais para uma nova fase do transporte, em que a atividade conta com recursos tecnológicos para benefício de todos”, avalia o advogado ligado à confederação.

 

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