Espelho da economia

Indústria automotiva brasileira acompanha indicadores macroeconômicos e tem o papel de impulsionar a competitividade do país frente ao mercado internacional

Capa / 02 de Novembro de 2016 / 0 Comentários
A- A A+

O balanço de vendas, produção e exportação de automóveis e máquinas agrícolas e rodoviárias em agosto e no acumulado deste ano aponta aumento de 1,4% nas vendas de veículos novos no país – foram 183,9 mil unidades em agosto e 181,4 mil em julho. As informações são da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

A produção em agosto recuou 6,4% frente a julho: foram 177,7 mil unidades e 189,9 mil, respectivamente. No comparativo com o mesmo período do ano passado, quando 217,8 mil unidades deixaram as linhas de montagem, a contração é de 18,4%. No acumulado deste ano, com 1,39 milhão de unidades, o resultado foi de baixa de 20,1% contra as 1,73 milhão de unidades de 2015.

Nas exportações, 40,2 mil unidades foram enviadas para outros países em agosto, o que mostra baixa de 11,8% ante as 45,6 mil de julho e aumento de 16,7% comparando-se com as 34,4 mil unidades de agosto do ano passado. Neste ano, a indústria automobilística brasileira exportou 312,4 mil unidades – alta de 19,6% contra as 261,2 mil unidades de 2015.

As vendas de 4.400 caminhões ficaram inferiores em 6,1% em agosto na análise com as 4.700 de julho e em 24,3% ante as 5.800 do mesmo período de 2015. No acumulado deste ano, com 34,7 mil unidades, a baixa é de, 30,1% defrontando 49,6 mil unidades do ano passado.

O resultado da produção de caminhões no oitavo mês de 2016, com 5.200 unidades, apresentou pequena elevação de 2,4% frente às 5.100 unidades de julho, mas caiu 1,4% na comparação com as 5.300 de agosto de 2015. Até agosto, foram produzidas 41,6 mil unidades, o que significa queda de 22,3% ante o mesmo período do ano passado, com 53,5 mil unidades.

De forma geral, o presidente da Anfavea, Antonio Megale, destaca a estabilidade de agosto e pondera pontos positivos: “Foi o melhor mês do ano para o licenciamento de veículos novos, mas poderia ter sido ainda melhor. As Olimpíadas surpreenderam todos e deram uma injeção de ânimo no país, mas impactaram alguns negócios durante o período, principalmente na cidade sede, o Rio de Janeiro. Ainda que em um patamar baixo, registramos novamente estabilidade na média de vendas diárias”.

Conexão

Paralelamente, estudo divulgado em 23 de setembro pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela que a tendência é que o resultado do Produto Interno Bruto (PIB), soma dos bens e serviços produzidos no país, mostre mais uma queda no terceiro trimestre e, no próximo, tenha um resultado “senão positivo, já estável”. A avaliação é do economista Leonardo Mello de Carvalho, autor da análise.

Segundo o especialista, os resultados dos investimentos voltaram a crescer na comparação com o trimestre anterior após dez períodos de queda. “Se ainda não se consegue falar que a recessão acabou, acho que dá, sim, para dizer que a economia caminha para uma etapa de estabilidade, que o pior da crise já foi superado, com base nessa trajetória de queda mais suave da maioria dos indicadores e de crescimento já em alguns”, reiterou.

Outro indicador é o aumento do Índice Nacional de Expectativa do Consumidor (Inec) em 0,8% no mês de agosto deste ano na comparação com julho. Foram alcançados 102 pontos, conforme  informou a Confederação Nacional da Indústria (CNI) com base em pesquisa com 2.002 pessoas entre 11 e 15 de agosto deste ano. “O aumento da confiança dos brasileiros é resultado da melhora das perspectivas sobre a inflação, o desemprego e a renda pessoal nos próximos seis meses. Além disso, os consumidores acreditam que a situação financeira melhorou nos últimos três meses”, informou a CNI.

Existe forte conexão entre o desempenho da indústria automotiva, os indicadores macroeconômicos – o PIB – e a expectativa do consumidor. O segmento automobilístico responde por 10% da indústria nacional e, consequentemente, por 2,2% do PIB, de acordo com cálculos da Tendências Consultoria, considerando-se apenas a produção de veículos. Toda a cadeia produtiva engloba segmentos como os de autopeças, siderurgia, química, plástico e borracha, além da área de serviços, como revendas e financeiras. Somando-se as autopeças, a participação do setor no PIB sobe para 5%. No segmento industrial, é de 21%. Ou seja: se a indústria automotiva cresce, o Brasil cresce, e vice-versa.

Pano de fundo

Por sua importância, a indústria automobilística brasileira tem sido amparada por incentivos governamentais desde seu surgimento no país, em 1956. Cinco meses depois de tomar posse, Juscelino Kubitschek assinou um decreto que criava o grupo executivo da indústria automobilística, chamado pela sigla Geia, que trazia o primeiro da série de estímulos que andariam junto com a própria história da produção de veículos no Brasil.

Hoje, para o presidente da Anfavea, Antonio Megale, diante da perspectiva de maior abertura comercial, a busca por maior competitividade na indústria automobilística deve estar no centro da política industrial que substituirá o regime automotivo a partir de 2018. Segundo ele, o regime automotivo conhecido como Inovar-Auto, cujas regras vencem no fim do ano que vem, não mostrou os resultados esperados na evolução da competitividade e do desenvolvimento do setor, sobretudo na cadeia de autopeças.

Com incentivos ao desenvolvimento de carros mais eficientes, esperava-se, na época do lançamento do Inovar-Auto, em outubro de 2012, que a indústria automobilística brasileira desse um salto tecnológico que permitiria às montadoras do país concorrer no mercado global. O incentivo para as fábricas de autopeças viria do maior consumo de componentes locais nas linhas de montagem, já que o regime também vinculou a concessão de créditos tributários a compras de insumos nacionais.

O regime automotivo, de política centrada na nacionalização, levou novas montadoras a investirem no Brasil, mas, com a crise doméstica, ou seja, a perda do poder de compra do brasileiro, o resultado foi uma ociosidade nessa indústria, a qual hoje passa de 50%.

Caminho profícuo

Para dar previsibilidade às empresas, o presidente da Anfavea reafirmou que a próxima política industrial deve ter o prazo de dez anos, cinco a mais do que o regime atual. A política que vai substituir o Inovar-Auto é a prioridade da Anfavea nas negociações com o governo, junto com o programa nacional de renovação de frota, prometido pelo Planalto para o ano que vem.

Estudos realizados pelo Grupo da Coalizão de toda a cadeia produtiva automobilística apontam que a renovação da frota pode gerar uma economia de R$ 5 bilhões por ano, sem contar os benefícios ambientais, o aumento da produtividade e as vendas de novos veículos, propiciando mais negócios.

Crise

O presidente da Anfavea avalia que a indústria de veículos talvez esteja enfrentando a pior crise de sua história, mas ele repetiu a expectativa de início de uma recuperação no fim deste ano. A crise que levou à redução drástica das vendas e da produção de veículos no Brasil provocou o fechamento, de 2014 até agora, de 31 mil vagas nas montadoras. Foram demitidos mais de 50 mil trabalhadores nas autopeças e mais de 124 mil nas concessionárias, numa conta que supera 200 mil cortes.

Por compor a cadeia produtiva, o setor de transporte e logística está presente em todas as etapas da produção e do consumo de bens e serviços de um país. Quando o nível de atividade da economia se reduz, há diminuição na produção e no consumo de bens e serviços, gerando uma contração da demanda por serviços de deslocamento. Isso faz com que o setor de transporte seja impactado negativamente por uma crise econômica como a que o país vive atualmente. Por sua vez, um menor volume de serviços de transporte resulta em queda do nível de atividade de outros segmentos que dependem de seu desempenho.

Segundo o boletim “Economia em Foco”, da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), devido à recessão, o volume de serviços do setor de transporte e logística se mostra negativo no primeiro semestre de 2016 (-5,9%), e o transporte terrestre sofreu um impacto maior com a crise econômica do que os demais segmentos. Ele acaba por puxar para baixo os números do setor.

A prestação do serviço de transporte de uma mercadoria ou passageiro atua de forma interligada a outros segmentos da atividade econômica. Assim, além de impactar o nível de emprego, o menor volume de serviços prestados influencia atividades de prestação de serviços acessórios ou auxiliares ao setor (armazenagem, terminais, operadores etc.) e também as atividades de fornecimento de bens ou serviços (combustíveis, bens de capital, infraestrutura).

“A depressão econômica brasileira afetou todos os setores da economia. Como pôde ser visto, o setor de transporte e logística foi bastante prejudicado com a queda do nível de atividade. Ele, por sua vez, impactou adversamente segmentos econômicos interligados a ele, como auxiliares e fornecedores de bens e serviços, em um movimento sequencial. Faz-se mister que medidas sejam tomadas para reverter esse quadro para que haja o quanto antes a retomada do crescimento econômico. Para tanto, a CNT elaborou, no fim de 2015, o Plano de Recuperação da Economia, em que apresenta medidas e soluções que visam à retomada da economia brasileira. Seus pontos principais são o retorno do investimento em infraestrutura e a renovação da frota de caminhão”, diz o boletim.

Luciano Medrado, consultor técnico do Sindicato e da Federação das Empresas de Transportes de Cargas do Estado de Minas Gerais (Setcemg e Fetcemg, respectivamente), explica que o setor de transporte é o primeiro a entrar em crise em momentos de retração econômica e também o último a sair. “Ele está no meio da cadeira – de um lado, tem a indústria de transformação e, de outro, o consumo. O transporte faz a movimentação entre as pontas e, por isso, sente fortemente os impactos. A saída é acreditar no controle das contas públicas e no resgate da credibilidade. Se se gera confiança no mercado e nos brasileiros, gera-se investimento e, consequentemente, emprego e renda/consumo. A retomada será lenta, mas observo uma reversão de expectativa: aquele que tinha o olhar negativo vê com mais neutralidade ou até de forma positiva os próximos passos econômicos”, declarou.

Investimentos continuam

O mercado adverso não impede que montadoras que atuam no Brasil parem com seus investimentos. A Toyota, por exemplo, inaugurou em agosto seu primeiro Centro de Pesquisa Aplicada na América Latina. O projeto recebeu investimento de R$ 46 milhões e foi instalado na fábrica de São Bernardo do Campo (SP). No local, serão realizadas atividades de pesquisa de novos produtos e concepção de melhorias nos modelos, além de teste de emissões, análise de matérias-primas e desenvolvimento de acessórios. A unidade fabril emprega 1.400 trabalhadores, que são responsáveis pela produção de peças para os modelos Corolla e Etios.

A Ford iniciou as operações de seu laboratório de polímeros instalado no centro de desenvolvimento de produto na fábrica de Camaçari (BA). O local possui equipamentos como máquina de ensaio de índice de fluidez e microscópio, que permitem a análise da composição dos materiais. Os polímeros compõem cerca de 60% das peças plásticas dos veículos, como acrílicos e ABS.

A General Motors celebrou 16 anos de atividades da fábrica de automóveis em Gravataí (RS), bem como a marca de 3 milhões de veículos produzidos naquela unidade. O complexo industrial reúne 19 empresas fornecedoras e é responsável pela produção dos modelos Prisma e Onix.

A fabricante de ônibus Marcopolo celebrou 67 anos de atividades no Brasil com sua fábrica em Caxias do Sul (RS). A empresa fabrica modelos para os segmentos urbano e rodoviário, além de micros e intermunicipais, tendo já produzido em sua história mais de 350 mil unidades.

A Fiat comemorou em julho 40 anos de atividades em nosso país. Desde 1976, a montadora produz veículos na fábrica de Betim (MG), que tem capacidade instalada de 800 mil unidades por ano. Até agora, quase 15 milhões de veículos foram fabricados pela empresa, e mais de 3 milhões, exportados. Desde 2010, a planta passa por um ciclo de investimento de R$ 7 bilhões para a modernização da unidade fabril e para o desenvolvimento de novos produtos.

A FCA anunciou o investimento de R$ 6,6 milhões, a serem aplicados até 2020, para a instalação do Laboratório de Inovação Veicular em parceria com o Centro de Informática da Universidade Federal de Pernambuco (Cin-UFPE). O objetivo é realizar pesquisas e gerar soluções para a área de tecnologia automotiva, além de contribuir para a capacitação profissional dos alunos da universidade. O local conta com uma rede de computadores, bancadas de eletrônica, equipamentos de medição e estruturas de experimentação para testes de protótipos de veículos.

A BMW comunicou o investimento de R$ 2 milhões até 2018 para a implantação de novos formatos de atendimento de pós-venda da marca. Serão criados dois modelos, um voltado para a realização de serviços rápidos de manutenção, feitos em até uma hora e meia, e outro capaz de oferecer atendimento personalizado em um ambiente exclusivo. Algumas concessionárias do grupo já estão certificadas para proporcionar os modelos de atendimento. O objetivo da empresa é que toda a rede esteja preparada até o início de 2018.

A Jaguar Land Rover inaugurou em junho sua fábrica em Itatiaia (RJ) – a primeira integralmente própria fora do Reino Unido. A empresa investiu R$ 750 milhões na construção da nova unidade industrial, que produzirá os modelos Range Rover Evoque e Discovery Sport. A capacidade produtiva da empresa é de 24 mil unidades por ano, devendo ela gerar mil empregos diretos e indiretos. Na oportunidade, a Jaguar apresentou também centro educacional em conjunto com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) a fim de oferecer programas de educação para crianças e jovens.

“Foi o melhor mês do ano para o licenciamento de veículos novos, mas poderia ter sido ainda melhor. As Olimpíadas surpreenderam todos e deram uma injeção de ânimo no país, mas impactaram alguns negócios durante o período, principalmente na cidade sede, o Rio de Janeiro. Ainda que em um patamar baixo, registramos novamente estabilidade na média de vendas diárias.”

Antonio Megale, presidente da Anfavea

“Ele está no meio da cadeira – de um lado, tem a indústria de transformação e, de outro, o consumo. O transporte faz a movimentação entre as pontas e, por isso, sente fortemente os impactos. A saída é acreditar no controle das contas públicas e no resgate da credibilidade. Se se gera confiança no mercado e nos brasileiros, gera-se investimento e, consequentemente, emprego e renda/consumo. A retomada será lenta, mas observo uma reversão de expectativa: aquele que tinha o olhar negativo
vê com mais neutralidade ou até de forma positiva os próximos passos econômicos.”

Luciano Medrado, consultor técnico do Sindicato e da Federação das Empresas de Transportes
de Cargas do Estado de Minas Gerais (Setcemg e Fetcemg, respectivamente)

 

AVISO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião de Revista Entrevias. É vedada a inserção de comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros. Revista Entrevias poderá retirar, sem prévia notificação, comentários postados que não respeitem os critérios impostos neste aviso ou que estejam fora do tema da matéria comentada.