Tecnologia sobre rodas

Setor de transporte rodoviário de cargas apresenta inovações que prometem revolucionar a forma de trabalhar

Capa / 05 de Novembro de 2018 / 0 Comentários
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Imagine um caminhão transitando nas ruas da cidade e nas estradas sem motorista. Ou mesmo um veículo pesado conectado por 24 horas, tendo todos seus movimentos monitorados inclusive por drones. Ou ainda uma série de pontos de carregamento de energia nas vias para “abastecer”. Assim caminha a indústria da mobilidade! Situações que faziam parte de filmes de ficção começam a surgir no mercado de caminhões.

Sem dúvida, uma que promete revolucionar é a pilotagem por meio de inteligência artificial. Esse projeto, que ainda está sendo desenvolvido por diversas empresas, busca a diminuição de custos para corporações e transportadoras, além de especializar os tipos de funções executadas pelos caminhoneiros. A promessa é a redução de custos pelo fato de a condução se dar na maioria do tempo de maneira computadorizada e, por isso, altamente precisa. Essa programação na máquina pretende calcular e otimizar dados relacionados ao desgaste de pneus e peças, ao consumo de combustível, entre outros.

Caminhões elétricos, sem motorista e até mesmo sem cabine estão sendo desenvolvidos

Outra grande novidade é a ideia de que os caminhões estejam conectados, comunicando-se em tempo real com as empresas e com outros companheiros de estrada, 24 horas por dia, sete dias por semana, enquanto estiverem rodando. As informações serão sobre o próprio transporte, os sistemas acoplados de câmera e o monitoramento, de acordo com as prioridades que a frota determinar. 

Gestão

Enquanto essas novidades não chegam, transportadores podem contar com tecnologia para gerenciar a frota. Muitas companhias já a empregam para caminhões, extinguindo o trabalho manual e facilitando o controle dos veículos. Isso é possível quando todos os dados são guardados no próprio software, permitindo a manutenção preventiva. Assim, os gastos dos automóveis são reduzidos, e a quantidade de veículos disponíveis para executar as operações cotidianas é sempre certa. Além de todos esses fatores e características, produzem-se relatórios pautados nas estatísticas reais recebidas, auxiliando em tomadas de decisões estratégicas e influenciando diretamente na produtividade.

Tão importante quanto gerenciar a frota é planejar as rotas de deslocamento. Essa ação oferece mais segurança e diminui o prazo de entrega e os custos. O sistema de roteirização tem como principal funcionalidade a otimização das rotas de viagens, uma vez que se encarrega de disponibilizar os melhores trajetos com base em mapas virtuais. A utilização de dados de geolocalização evita que o caminhão trafegue em congestionamentos; utilize rodovias em más condições; siga caminhos desnecessários; gere custos maiores para o negócio com pedágios, combustível e desgastes do caminhão. Vale ressaltar que essa tecnologia facilita o cálculo do frete e também diminui o prazo de entrega.

Presente nos carros de passeio há algum tempo, o computador a bordo está sendo instalado com mais frequência em caminhões. Esse equipamento é uma das tecnologias que descomplicam a inspeção de diversas informações importantes, como horímetro – utilizado para somar as horas de operações dos veículos –, quilometragem total e parcial e dados sobre eventuais falhas nos componentes. Ele ainda consegue fazer diagnósticos que ajudam na hora da manutenção, uma vez que os problemas são facilmente descobertos, graças aos registros em tempo real. Esse dispositivo ainda avalia a necessidade de troca de óleo lubrificante, o que ajuda a prolongar a vida útil do motor. 

Segurança

Além da otimização de custos, a tecnologia é aliada da segurança. Uma das tecnologias para caminhões mais notáveis é o Controle Eletrônico de Estabilidade (ESC), que diminui as chances de derrapagem e capotagem em curvas — funcionalidade indispensável para caminhões que puxam cargas extensas e pesadas, como bitrens graneleiros. Esse sistema garante o equilíbrio do caminhão em trajetos molhados pela chuva, pelo gelo ou pela neve e reage somente quando detecta pouca tração e o veículo precisa efetuar uma manobra. Também reduz a incidência de tombamento do caminhão quando ele está transitando em solo seco e precisa frear repentinamente.

Ele funciona por meio de vários sensores instalados nas rodas, na caixa de direção e no eixo longitudinal. O módulo eletrônico do ESC identifica que o carro se movimenta em um sentido diferente daquele estabelecido pelo motorista. Assim, por meio de 25 leituras por segundo, ele compara a direção do volante com a trajetória real que o carro está assumindo (derrapando ou saindo de frente). E, em uma fração de segundo, o módulo age, aliviando a tração do motor e aplicando (pulsando) o freio na roda mais indicada, para restabelecer a trajetória original.

Apesar de serem sistemas gerenciados por diferentes módulos, o controle de estabilidade e o sistema ABS (de antitravamento das rodas) possuem alguns itens de uso comum: os sensores das rodas e o corpo de solenoides, que direcionará a pressão de óleo de freio para a roda indicada pelo módulo eletrônico.

O Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovou a obrigatoriedade do controle eletrônico de estabilidade para carros novos a partir de 2020. A primeira leva será válida para modelos inéditos e os que passarem por grandes mudanças. Na segunda fase, em 2022, o controle de estabilidade será obrigatório também nas unidades 0 km de modelos que foram lançados.

Outro sistema que colabora para a segurança é o monitoramento via drones. Sua intenção é ajudar a reconhecer paradas repentinas e movimentações suspeitas. Telas de bloqueio também auxiliam a evitar furtos. Elas são fixadas em compartimentos de cargas e podem ser acionadas por meio de controle remoto, sensores ou manualmente. 

“A principal tendência mundial na mobilidade elétrica é a na construção de veículos elétricos cada vez mais conectados, semiautônomos e de serviços compartilhados. O elétrico se viabiliza cada vez mais nas aplicações de uso intensivo ou com altas quilometragens, como, por exemplo, em veículos
de entregas urbanas ou caminhões compactadores de lixo.”
Adalberto Maluf, diretor de marketing, sustentabilidade e novos negócios da BYD Brasil
e diretor da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE) para Veículos Pesados

Autonomia

Em 12 de setembro, outra inédita solução de transporte foi apresentada na Conferência de Inovação do Grupo Volvo, em Berlim. São veículos elétricos autônomos, conectados remotamente a um centro de controle que monitora parâmetros diversos, como localização, cargas física e da bateria de cada veículo. Os dados são utilizados para garantir que a logística da frota e o fluxo das mercadorias e dos veículos sejam o mais eficientes possível. O sistema é destinado à aplicação em áreas de curta distância, com altos volumes de carga e elevada precisão de entrega (como o transporte entre indústrias e portos).

Também em setembro, a Mercedes-Benz do Brasil aproveitou o Salão Internacional de Veículos Comerciais de Hanover, na Alemanha, para anunciar negociação de 16 unidades do Axor 3131 com tecnologia de direção autônoma para aplicação na colheita da cana-de-açúcar.

O pacote, baseado em sistema de geolocalização e atuadores eletrônicos em sistema hidráulico na direção, permite que o caminhão trafegue pelas linhas de plantação de maneira autônoma, com precisão de 1,5 a 2,5 centímetros. O objetivo é evitar que o veículo destrua os brotos da cana, os remanescentes que dão origem à safra posterior.

A Mercedes-Benz apresentou o Axor 3131, com direção autônoma para aplicação na colheita da cana-de-açúcar

Atualmente, há dois veículos em operação na Usina Alta Mogina, de São Joaquim da Barra (SP). Para cumprir a missão, o Axor recebeu uma bitola de 3 m, mais larga para se ajustar às linhas da plantação, pneus flutuantes, suspensão mista, que combina arranjo metálico e pneumático, e um segundo eixo direcional, configurando o veículo como 8×4. Sua capacidade chega a 18 toneladas de carga útil em caçamba de 40 m³.

O argumento para enfatizar as vantagens da automatização no campo é a produtividade. Com o uso de um caminhão autônomo, de cada duas safras da cana-de-açúcar, ganha-se a produção de uma terceira só por se evitar o esmagamento dos brotos pelos pneus.

A ZF também anunciou no Salão de Hanover o investimento em direção autônoma. Para as entregas urbanas de cargas fracionadas ou mesmo para atender a chamada última milha, a empresa apresentou um comercial leve totalmente elétrico e autônomo. Equipado com um computador de alta velocidade chamado ZF ProAI e com um conjunto de sensores, câmeras, radares e tecnologia lidar, o modelo pode trafegar no trânsito de maneira independente, capaz de desviar-se de obstáculos, de reconhecer semáforos e de reagir a situações de risco.


Empresas já testam caminhões e furgões autônomos

Uma das funções que incorporam o veículo é o Follow Me. Por tablet, o motorista/entregador consegue fazer com que o furgão siga seus passos, uma solução para duas ou três entregas em uma mesma rua, por exemplo. No caso de não haver vagas de estacionamento, a van também pode seguir em busca de uma. 

Motores elétricos

O constante pensamento sustentável tem incentivado o mercado automotivo a procurar novas fontes de energia. Uma delas são os caminhões equipados com motores elétricos. Entre suas vantagens mais notáveis está a redução na emissão de gases poluentes na atmosfera. Além disso, a produção de energia elétrica é muito menos prejudicial ao meio ambiente se comparada com a queima de combustível fóssil.

Mas os benefícios não param por aí. Esse tipo de motor quase não emite ruídos, o que ajuda a minimizar inclusive a poluição sonora gerada pelo tráfego, garantindo uma direção mais agradável. Sua manutenção também merece destaque, pois ele contém componentes e peças distintas das dos motores convencionais.

“A principal tendência mundial na mobilidade elétrica é a construção de veículos elétricos cada vez mais conectados, semiautônomos e de serviços compartilhados. O elétrico se viabiliza cada vez mais nas aplicações de uso intensivo ou com altas quilometragens, como, por exemplo, em veículos de entregas urbanas ou caminhões compactadores de lixo”, explica o diretor de marketing, sustentabilidade e novos negócios da BYD Brasil, Adalberto Maluf – que também é diretor da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE) para Veículos Pesados.

Ele ressalta que os veículos elétricos têm um custo maior de aquisição, porém seu gasto operacional é bem menor (cerca de 80%). No tempo total de operação do veículo, o TCO (custo total de propriedade) é muito favorável ao veículo elétrico em relação ao à combustão, uma vez que se economiza muito na operação.

“O Brasil estava um pouco fora do debate internacional devido à sobretaxa dos veículos elétricos. Com o Rota 2030, foram retiradas as primeiras barreiras, criando uma sinalização positiva para a pesquisa, o desenvolvimento e a viabilização desse mercado. Porém, se o Brasil realmente deseja transformar-se em um importante parque industrial para a indústria automotiva do século 21, o governo deverá ter uma postura mais agressiva em relação à criação de incentivos e subsídios para fomentar a tecnologia em território nacional e, assim, fazer com que a indústria local possa também ser parte dessa transformação”, diz Maluf.

O programa Rota 2030 foi aprovado em 24 de outubro, por uma comissão mista da Câmara dos Deputados, em Brasília. Agora, o texto irá passar por votação na Câmara e no Senado. Como é uma medida provisória, o projeto precisa ser aprovado no Congresso até 16 de novembro.

A proposta substitui o Programa Inovar Auto de 2013 e prevê isenções fiscais para a aquisição de veículos híbridos e elétricos, novas metas de eficiência energética e um cronograma para a inclusão de equipamentos de segurança para os carros. O novo plano de mobilidade e de logística também estabelece novas diretrizes para a indústria automobilística. O Rota 2030 contempla ainda incentivos fiscais de aproximadamente R$ 1,5 bilhão ao setor nos próximos cinco anos para montadoras e empresas do setor.

Iêda de Oliveira, diretora executiva da Eletra e vice-presidente da ABVE para Veículos Pesados, avalia que o principal desafio no Brasil é a decisão de mudança: “É preciso que a implementação da mobilidade elétrica no país esteja prevista em plano de governo. Dessa forma, todos os requisitos necessários para sua execução – como financiamento, planejamento de infraestrutura, indústria instalada – sairão do papel”.

Ela avalia que o Brasil, do ponto de vista tecnológico, está bem posicionado. Contudo, mais lentamente caminham as políticas públicas. De acordo com Maluf, “a legislação brasileira, em especial nos temas tributários, ainda se coloca como um empecilho. Por exemplo, o caminhão elétrico paga 18% de ICMS, enquanto um caminhão comum arca com 12%. Já um automóvel elétrico paga 25% de ICMS, enquanto um carro à combustão flex arca com entre 7% e 18%. Precisamos resolver esses gargalos fiscais para abrir portas para a criação de um mercado e, com isso, gerar outros incentivos que fomentem o segmento.

Para isso, ele aponta políticas públicas que podem fomentar a mobilidade elétrica no país, seja nas questões tributárias, como impostos menores e isenções de IPVA, seja com outros incentivos, como, por exemplo, liberando os veículos elétricos da restrição de rodízio, reduzindo o IPVA, garantindo estacionamento prioritário, autorizando o uso das faixas exclusivas para ônibus etc. Também é preciso criar legislações que incentivem ou facilitem o poder público, as empresas e aquelas aplicações de uso mais intensivo a conseguirem financiamento privilegiado. 

Na ponta

A indústria busca atuar em projetos de caminhões elétricos. No Salão de Hanover, a Volkswagen Caminhões e Ônibus levou mais uma versão do e-Delivery, o caminhão elétrico da empresa apresentado na Fenatran 2017 como protótipo. O veículo está em campo pelas mãos da Ambev, e o caminhão deverá começar a ser produzido em série até 2020.

A F Electric é uma unidade de trator 4×2 com autonomia de 100 km

DAF mostra um de seus Innovation Trucks: o DAF CF Electric. A CF Electric é uma unidade de trator 4×2 desenvolvida para aplicações de distribuição de PBTC de até 40 toneladas em áreas urbanas. O veículo usa a tecnologia E-Power da VDL para operação totalmente elétrica. O centro do powertrain inteligente é o motor elétrico de 210 kW (equivalente a 285 cv), que extrai energia da bateria de lítio de 170 kWh. A CF Electric tem um alcance de aproximadamente 100 km. Essa autonomia equivale a rodar com um caminhão convencional com um tanque de combustível de apenas 25 litros.

O carregamento das baterias pode ser realizado em 30 minutos, enquanto uma carga completa pode ser concluída em uma hora e meia. A primeira série de caminhões CF Electric será colocada em operação de teste de campo com os clientes neste ano. 

Mercado brasileiro

Estudo feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que, embora seja um grupo pequeno, de cerca de 60 empresas, as multinacionais brasileiras são mais inovadoras do que as companhias estrangeiras e os grandes grupos nacionais instalados no país. O estudo tem como base a última Pesquisa de Inovação (Pintec), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi coordenado pelo Fórum de Empresas Transnacionais da CNI, que detalhou os resultados dos segmentos alimentício, têxtil, químico, metalúrgico, de couros e calçados, celulose e papel, veículos automotores e máquinas, aparelhos e materiais elétricos.

Do grupo de multinacionais, 55, ou 92% delas, desenvolveram produtos ou processos produtivos inovadores nos três anos analisados, de 2012 a 2014 – a pesquisa é feita a cada triênio, e a próxima será divulgada no fim deste ano. Entre as 457 empresas estrangeiras, 371 foram classificadas como inovadoras (81% delas). No grupo de 1.239 indústrias nacionais com mais de 500 funcionários, o índice é de 62%, ou 766 corporações.

Criado há cem anos por empreendedores do Rio Grande do Sul, o grupo Lochpe-Maxion – hoje com 31 fábricas, sendo quatro no Brasil e as demais em 14 países – testa atualmente uma roda inédita no mundo. Desenvolvida nos centros da empresa no Brasil e na Alemanha, em parceria com a Michelin, ela se deforma ao passar por buracos e obstáculos.

Empresas brasileiras também estão desenvolvendo o primeiro caminhão movido 100% a energia de fabricação nacional em escala comercial. O motor e inversores elétricos estão sendo fabricados pela Weg. 

No mundo

Os países desenvolvidos investem pesado em tecnologia no setor de transporte como um todo. Câmeras que vão substituir os espelhos retrovisores, projetando a imagem em duas telas de 15” (com resolução de 720 x 1.920 pixels) montadas nas colunas da cabine estão em desenvolvimento.  

A MirrorCam é útil durante a condução e também nos horários de descansos, em que o motorista pode monitorar o lado externo do caminhão

O chamado MirrorCam é útil não somente durante a condução – quando estiver descansando, o motorista poderá verificar a área ao redor com o toque de um botão perto de sua cama. O sistema funciona mesmo se o caminhão estiver desligado. E os pontos pré-definidos de fixação na estrutura das portas são padrão. 

Colete faz conexão com celular e protege motorista em caso de assalto

A Scania lançou o C-me: um colete de trabalho capaz de aumentar a segurança do motorista. Dotada de tecnologia de conectividade, a peça permite configurar diversas funções por meio de aplicativo, como nível de iluminação, condições externas do caminhão, número do telefone de emergência, entre outras programações. Os ajustes são realizados via conexão Bluethooth com o celular do motorista. Do próprio celular é feita a comunicação com o sistema de gestão de frota da fabricante, o Scania Fleet Management. Dessa maneira, a aplicação pode transmitir eventual alarme e determinar a posição real do motorista. O equipamento estará disponível na Europa ainda neste ano. 

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