Uma luz no fim do túnel

Lideranças do transporte rodoviário de cargas avaliam pacote de medidas para o setor anunciado pelo governo federal

Capa / 16 de Maio de 2019 / 0 Comentários
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Um sopro! Assim as lideranças do transporte rodoviário de cargas em Minas Gerais – ouvidas pela equipe de reportagem da Entrevias – avaliaram as medidas anunciadas em 16 de abril pelo governo federal. Chamadas de “Pacote Caminhoneiro”, as iniciativas têm o objetivo de acalmar os rumores de uma possível paralisação da categoria no próximo mês.

Segundo o Executivo federal, as ações são consideradas estruturantes para atender ao segmento. Entre as medidas estão a liberação de R$ 500 milhões para quem tem até dois caminhões, em financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para serem usados na manutenção e na compra de pneus. O governo não esclareceu quais serão as condições de pagamento (juros e prazo) nem informou a partir de quando esse crédito estará disponível.

Anúncio foi feito pelos ministros da Secretaria-Geral, Floriano Peixoto, da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e do GSI, general Augusto Heleno

De acordo com o Ministério da Infraestrutura, serão investidos R$ 2 bilhões para a conclusão de 66 km da BR-381/MG e para 69 km de duplicação da BR-116/RS. Na região Norte, o foco é a BR-163/PA, com pavimentação até o porto de Miritituba e a complementação do trecho de Estiva a Bacabeira (BR-135/MA). No Nordeste, a previsão é a duplicação de 84 km da BR-101/BA. Na BR-242/MT, serão feitos o licenciamento ambiental e a construção de oito as de concreto, que vão substituir pontes de madeira. No Rio Grande do Sul, foi prometida a entrega da ponte do Guaíba.

Ainda sobre infraestrutura, foi anunciado o investimento para a implementação de paradas, onde os caminhoneiros poderão descansar e se alimentar. Esses pontos serão obrigatórios nos contratos de concessão de rodovias. Também haverá paradas nas rodovias já concedidas.

O pacote apresentou um novo prazo de validade para a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) de motoristas. O governo vai dobrar de cinco para dez anos a validade dessa documentação. Vai criar ainda uma espécie de certificado eletrônico, reunindo uma série de documentos hoje necessários para o exercício da profissão, o que deve reduzir os gastos dos profissionais com despachantes.

No que tange à saúde, programas para caminhoneiros por meio da assistência médica do Sest/Senat terão investimentos em várias cidades que são eixos de passagem do transporte rodoviário.

“Entendemos que o governo federal está se mobilizando para apresentar ações para o transporte. Contudo, há problemas estruturais, que são fruto da falta de investimento nos últimos anos e, nesse sentido, precisam de outras soluções. O pacote é uma luz no final do túnel”, avalia o presidente da Associação Particular de Ajuda ao Colega (Apac Sul), Márcio Arantes. 

Estopim

Anunciado em março pela Petrobras, o cartão de pagamentos possibilitará a compra por caminhoneiros de litros de diesel a preço fixo nos postos com a bandeira BR, permitindo que eles antecipem a compra de diesel a preço fixo. Com isso, vão conseguir reduzir os riscos ligados às oscilações do preço do combustível.

Contudo, o governo não anunciou nenhuma medida relacionada a mudanças na política de preços da Petrobras. Desde outubro de 2016, os reajustes no combustível são baseados na paridade com o mercado internacional e mais uma margem praticada para remunerar riscos inerentes à operação, como, por exemplo, volatilidade da taxa de câmbio e dos preços sobre estadas em portos, além de tributos.

No ano passado, caminhoneiros fizeram protesto em Brasília pedindo redução no preço do diesel

“Nossa avaliação é que há um avanço. O governo está interessado em promover o crescimento do país e sabe que os caminhoneiros têm papel importante no desenvolvimento. Quanto à questão do diesel, ela está contemplada na política do piso mínimo. Ou seja, a variação do combustível deverá acompanhar os custos dos serviços. Acredito que os caminhoneiros não terão prejuízo. É uma questão internacional. O barril do petróleo subiu muito, e não há como o governo absorver. É preciso ter equilíbrio”, justifica o presidente do Sindicato das Empresas Transportadoras de Combustíveis e Derivados de Petróleo do Estado de Minas Gerais (Sindtanque/MG), Irani da Silva Gomes. 

Tabela de frete

Como mostra a reportagem “Sem multa para caminhoneiros”, nesta edição, a ANTT decidiu, no fim de abril, suspender as multas aplicadas pelo descumprimento da tabela do frete mínimo. Mas a novela do tabelamento é grande. Em julho do ano passado, a Política de Preços Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas foi instituída. Na sequência, sofreu modificações no Congresso Nacional, mas virou lei em agosto. Tabelas foram publicadas, e a ANTT iniciou a fiscalização.

No dia 22 de abril, representantes de caminhoneiros e integrantes da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) se reuniram com o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, e firmaram um acordo. Foram prometidas medidas como o reajuste da planilha da tabela de frete, uma das principais reivindicações do grupo. “Construímos em conjunto agenda de trabalho que envolve eliminação de multas injustas, transferência do custo do diesel para a tabela de frete, fiscalização dessa referência de custo e termo de compromisso com entidades representantes para tornar a fiscalização mais efetiva”, escreveu Freitas em sua conta no Twitter.

Mesmo com as multas suspensas, a discussão sobre o tema continua. O presidente do Sindtanque/MG, Irani Gomes, considera que o caminhoneiro não deve fazer o serviço abaixo do piso mínimo: “Somente assim ele poderá gerir melhor seu caminhão e seus negócios. É um direito. A lei está funcionando como foi instituída. Se o embarcador não quer pagar, não transporte. O investimento em fiscalização vai minimizar esse tipo de postura”.

O presidente do Sindicato dos Cegonheiros de Minas Gerais (Sintrauto), Carlos Roesel, corrobora a importância de os embarcadores cumprirem o piso mínimo do frete e, se não o fizerem, terem consequências: “Participei da elaboração da planilha dos custos juntamente com diversos representantes do transporte rodoviário de cargas em grupos de trabalho, e foi calculado o mínimo para que o profissional possa sobreviver, fazendo com que sua atividade seja realizada de forma digna. Por isso, basta o governo aplicar de modo correto a norma, especialmente para embarcadores. A ANTT multa os transportadores, mas os embarcadores estão fora da lei, e os fretes continuam abaixo do piso mínimo. Então, por que a ANTT também não multa os embarcadores que descumprem a tabela?”.

Ele acrescenta que, nesta gestão do Executivo federal, a Advocacia-Geral da União (AGU) se mostrou favorável à tabela de frete, sendo necessário monitorar se a bancada do agronegócio não irá fazer pressão junto ao governo para que se posicione contra a tabela. “Se o Executivo não quiser resolver as questões dos caminhoneiros, basta que ele não fiscalize o cumprimento da Política de Piso Mínimo. As medidas apresentadas no pacote, a meu ver, não atendem aos caminhoneiros que buscam seus direitos. Elas são necessárias, mas os transportadores precisam que a tabela seja aplicada e fiscalizada, inclusive pela Polícia Rodoviária Federal. Os agentes já verificam as cargas e poderiam monitorar também os embarcadores do país”, afirma. 

Marco do Transporte

Outro ponto criticado é que o governo, ao apresentar o pacote de medidas, não citou o Marco Regulatório do Transporte Rodoviário de Cargas no Brasil. “As iniciativas anunciadas são paliativas, de curto prazo. Temos problemas estruturais, que não serão resolvidos do dia para a noite. Contudo, o pacote detalha pautas importantes para o setor, previstas no Marco Regulatório”, analisa o presidente da Federação Nacional das Associações de Caminhoneiros e Transportadores (Fenacat), Luiz Carlos Neves.

Com 91 artigos, o Marco Regulatório estabelece regras de segurança nas estradas, infrações e condições de contratação de transportadores, como pagamento, seguros e vales-pedágio. As determinações valem para caminhoneiros autônomos, empresas de operação logística, transportadores de carga própria, cooperativas e empresas transportadoras de cargas e de valores, que ficam divididos de acordo com o número de veículos de carga e a capacidade de transporte em toneladas.

O Marco Regulatório foi aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados no dia 20 de junho, e o novo texto é um substitutivo do deputado federal Nelson Marquezelli (PTB-SP) ao Projeto de Lei 4.860/16, da deputada federal Christiane de Souza Yared (PR-PR), estando apensado ao PL 1.428/99. Agora, a matéria segue para o Senado e tramitará como PLC 75/2018, que será analisada primeiramente pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e, depois, pelas Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e de Infraestrutura (CI).

“Nossa avaliação é que há um avanço. O governo está interessado em promover o crescimento do país e sabe que os caminhoneiros têm papel importante no desenvolvimento. Quanto à questão do diesel, ela está contemplada na Política do Piso Mínimo. Ou seja, a variação do combustível deverá acompanhar os custos dos serviços. Acredito que os caminhoneiros não terão prejuízo. É uma questão internacional. O barril do petróleo subiu muito, e não há como o governo absorver. É preciso ter equilíbrio.”
Irani da Silva Gomes,
presidente do Sindtanque/MG


“Há muito tempo, trabalhamos com o setor e recebemos a demanda dos profissionais de regulamentar as atividades de forma mais justa e moderna. A premissa para a construção do projeto foi segurança em seu sentido mais amplo, e, em dois anos de elaboração, buscamos envolver todos os atores que atuam nas atividades do transporte. O objetivo é deixar um legado para o país, e, por isso, o trabalho continua. Vamos ter uma postura parceira e colaborativa com os senadores”, disse a deputada federal Christiane Yared à revista Entrevias em junho do ano passado.

“É fundamental que o Congresso destrave a pauta da Previdência para que outros assuntos – importantes para a sociedade – tenham andamento. Acredito que somente assim os setores produtivos vão começar a investir. A situação atual está muito preocupante, com alto índice de desemprego, e a população está sem dinheiro”, ressalta Neves. 

Moeda de troca?

O pacote lançado foi uma maneira de o governo amenizar a crise que pode culminar em uma nova paralisação dos caminhoneiros, a exemplo do que ocorreu no ano passado, quando o setor produtivo e a população em geral tiveram dificuldade em acessar insumos de alimentação e combustíveis.

“A greve é um instrumento de pressão, mas avalio que hoje é irresponsável esse movimento. Na época, foi necessária devido à inércia do governo. Atualmente, é preciso monitorar as medidas e sua implementação, além de buscar a execução de ações estruturantes”, enfatiza Neves.

O presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas do Centro-Oeste Mineiro (Setcom), Cláudio Ney de Faria Maia, também avalia que a greve está enfraquecida. Contudo, alerta que o governo deve se comprometer de fato com o segmento “As medidas anunciadas têm o foco no autônomo e estão aquém da expectativa do transportador. As empresas não se viram contempladas, e questões fundamentais passaram ao largo, como o preço do diesel e o tabelamento dos custos. O valor do combustível aumentou após o anúncio, e o governo deve fazer ações estruturadas e permanentes”, afirma Maia.

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